Nos conhecemos no elevador. Difícil saber qual dos dois estava mais atrasado. Eu segurava o celular, fone e bilhete único com uma mão e tentava fechar a bolsa com a outra. Ele abriu a porta, colocou uma pasta para segurar e voltou pro seu apartamento para tranca-lo. Nem percebeu minha presença.
Fiquei olhando para aquela pasta. Três meses de La Brea - é assim que comecei a avaliar o preço das coisas depois do meu primeiro emprego. Preta. Couro, com certeza. Aprendi a distinguir com meu avô. Minha vontade foi chuta- la pra fora e descer. Segurar a porta do elevador é tipo parar em fila dupla. Vantagem pra um, atraso de vida pra cinquenta. No caso era só pra mim. E também não era bem um atraso se vida. Era só na primeira aula. Mas só comecei a pensar dessa forma quando decidi dar mais cinco segundos de tolerância e, no 2, ele entrou. E percebeu que eu estava ali.
-Desculpa
Que voz doce. Que cheiro de café. Sorri.
-Bom dia
Ele sorriu. Olhou pro meu fichário.
-Faculdade?
-Ano que vem, espero!
-Aproveita. Passa tão rápido...
-É o que todo mundo diz. "Os melhores anos da vida..."
-Ah, isso eu nao concordo. Pra mim, a melhor época da vida é sempre o presente.
T
Ele abriu a porta e segurou enquanto eu saia. Deu pra sentir o cheiro do seu perfume.
-Boa aula
Não consegui responder. Entao eu só sorri.
E fui embora.
E passei o dia com aquilo na cabeça.
Isso foi numa sexta feira. Na primeira manhã de chuva do ano. Era o penúltimo dia do horário de verão. E foi o último dia em que eu saí de casa pra só viver mais um.